quinta-feira, 2 de julho de 2009

O "Predador da Zona Norte" - conto

humberto o sousa
A polícia estava em polvorosa, mais de doze agressões. Foi até criada uma “Força Tarefa”.
Ele atacava os consultórios odontológicos de mulheres dentistas no final do expediente, então a polícia catalogou todos os ditos consultórios, bem como o horário de fechamento, que passaram a ser monitorados por policiais civis em viaturas descaracterizadas com o apoio tático da policia militar.
Tudo isso porque a vítima número onze era a sobrinha de um Desembargador, que cobrou uma ação enérgica do governador. Claro que a Dra. Sobrinha não foi atacada diretamente, era mais feia que briga de foice no escuro, mas foi amarrada e amordaçada enquanto a sua auxiliar era brutalmente estuprada em sua presença. A Dra. Sobrinha ficou traumatizada, fechou a clinica e os policiais comentavam que foi por não ter sido ela a brutalmente estuprada.
Talvez por instinto, ou espírito de preservação, o estuprador, batizado pela imprensa sensacionalista de ”Predador da Zona Norte”, que quase foi preso no décimo segundo ataque, mudou de tática. Com uma boneca de pano cuidadosamente enrolada em um cobertozinho, dizendo que a sua filhinha estava com quarenta graus de febre, convenceu uma pediatra a reabrir a clinica para atendê-lo, e não deu outra. Alertados pelos funcionários da padaria localizada ao lado da clinica, que ouviram gritos, os policiais invadiram o estabelecimento e pegaram-no em flagrante, só de meias e camiseta, montado em cima da Dra. Japonesinha, totalmente nua, que era espancada violentamente com socos no rosto.
O “Predador” foi levado, depois de ser obrigado a se vestir entre tapas e safanões, para a delegacia do bairro e a vítima entre a vida e a morte, mas ainda nua, levada pelo helicóptero ambulância dos bombeiros diretamente para o Hospital das Clinicas.
...

A noticia da prisão do estuprador “vazou” para a imprensa e quando a viatura chegou com o preso, a delegacia estava cercada por repórteres, cinegrafistas e caminhões das grandes redes de televisão. Levaram quase dez minutos para atravessar o ultimo quarteirão até o distrito.
Os policiais desembarcaram e escoltaram o individuo para o interior e o trancaram em uma sala, dois deles, mais exaltados, pediram e foram atendidos, se trancaram junto e o que se passou lá dentro é um segredo profissional.
Uma hora depois o coitado andando com dificuldade foi levado à presença do Sr. Bacharel (Bel para os íntimos) de Direito Doutor Delegado e o escrivão para ser tomado o depoimento e o Dr. Delegado perguntou-lhe se o sangue que lhe cobria a camiseta era da vitima.
-Não seu dotô, é meu mesmo.
-Você será levado para o IML para fazer o exame de corpo delito, se você falar que os ferimentos que causaram este sangramento foram feito por algum policial você estará se complicando ainda mais.
-Num vô não seu dotô, us policia só me bateram nas minhas partes cum todo cuidado pru modi num machucá. Quem tirô sangue deu foi a dotora.
-Então foi por ela ter te machucado é que você quase matou ela na porrada.
-Não senhor.
-Então foi por quê?
Ele não responde, fica olhando para as mãos com os olhos distantes. O delegado pergunta para o escrivão qual era o nome do infeliz, já que ele tinha qualificado o criminoso.
-Olha Nerso ...
-Pode me chamá de Nercim.
O delegado querendo parecer amigável concorda, ele teria que fazer o cretino confessar tudo, os doze ataques anteriores e o ataque e a agressão atual, não poderia ficar esperando depoimento das vítimas, que envergonhadas, não apareceriam.
-Olha Nercim, você estuprou doze mulh...
-Num foi esse tantim não, foi mais.
-Quantas?
-Sei dize não, só sei qui foi um montão, quase uma por semana desde que vim pra São Paulo.
-E há quanto tempo você mora aqui?
-Quasi um ano.
O escrivão solta um assobio involuntário enquanto o delegado solta um palavrão. Mais uma vez a polícia seria esculhambada por não ter descoberto este maníaco antes. Volta a falar com o tarado à sua frente fingindo uma calma que não sentia, sentia mesmo era vontade de pegar este cretino e pendurá-lo pelos bagos e enviar-lhe todo um cabo de vassoura no rabo.
-Depois, quando eu tomar-lhe oficialmente o depoimento, você falará das outras. Voltando ao assunto da agressão física, quero saber, só por curiosidade, por que você agrediu a pediatra e não as outras. Você usou e abusou delas, mas não agrediu nenhuma fisicamente. Porque somente esta?
-Aconteceu um uns troço isquisitu. Quando eu entrei nela ela começou se mexer e me mordeu, rancó pedaço, aí eu dei um tapa nela e a xota dela começou a ispremé meu pau, foi tão gostoso, aí ela cumeço a ranhá minhas costas cum as unha, eu bati di novu e ela mi ispemeu di novu e começo gritá “bati mais, bati mais ...”. Mi impoguei e comecei a dá uma sova bem dada nela aí us pulicia chegaram e me prendeu.
Curiosidade resolvida, o Dr. Delegado começa a tomar o depoimento, omitindo naturalmente que a Dra. Japonesinha gozava quando apanhava.
...

O Dr. Delegado teve que pedir adiamento para a conclusão do Inquérito por duas vezes, tinha que pegar o depoimento da Pediatra. A coitada, em trinta dias, passou por cinco cirurgias plásticas para reconstituir o maxilar, a mandíbula e o nariz, fora os implantes dentários, havia perdido dois dentes.
Quando finalmente conseguiu autorização dos médicos para tomar-lhe o depoimento a filha-de-uma-puta falou que o sexo fora consensual e a agressão foi acidental.
O que injuriou mais o Dr. Delegado foi saber que ela havia contratado advogado para o tarado e iria depor como testemunha da defesa.
Não adiantou muita coisa o tal advogado caro. Dos trinta e oito casos apurados pelo Dr. Delegado (no início prostitutas de rua, depois empregadas domésticas da periferia que levantavam de madrugada para trabalhar nos bairros nobres e finalmente dentistas), dezessete das vítimas testemunharam e o infeliz foi condenado a uma pena que beirava a eternidade, ou seja, ficaria preso somente trinta anos.
...

Seis meses após o julgamento, jantando com um colega que trabalhava na cidade em que se localizava o presídio que servia de residência permanente para o “Predador”, o Dr. Delegado recebeu uma noticia que o deixou mais puto ainda: a Dra. Japonesinha tinha se mudado para uma cidade vizinha, conseguiu um emprego de Pediatra da prefeitura e havia entrado com um pedido para visitas intimas.

Ilustração: http://www.imotion.com.br/imagens/details.php?image_id=6554

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